“劳动改革对工作世界的意义与影响”档案

José Dari Krein, Márcio Túlio Viana
{"title":"“劳动改革对工作世界的意义与影响”档案","authors":"José Dari Krein, Márcio Túlio Viana","doi":"10.33239/RTDH.V2I1.46","DOIUrl":null,"url":null,"abstract":"Muito já foi dito e escrito sobre a reforma trabalhista. O próprio termo “reforma” já passou por uma espécie de reforma: há os que o escrevem com aspas, enquanto outros o traduzem por “deforma”, ou seja, exatamente pelo seu oposto. \nNa verdade, o nosso tempo não inventou apenas os clones de ovelhas, mas tem produzido falsificações de todo tipo. Muitas são explícitas e inocentes, como acontece com os grupos que imitam os Beatles. Outras são ocultas e dolosas, como o tênis de marca fabricado num quintal clandestino. \n Entre essas últimas falsificações se inserem, também, as imateriais, não palpáveis, como, por exemplo, no caso do político que se faz de democrata mas incentiva a violência; ou no da imprensa que noticia um crime ambiental como se fosse um acidente. \nNa mesma hipótese poderíamos incluir a avalanche de fake news que invadiu o País, a ponto de convencer multidões de que na Holanda os bebês são treinados para o sexo ou no Brasil os professores têm trocado a atividade de pesquisa por práticas como o incentivo à “baderna”, à revolução comunista e até mesmo à pedofilia. \nOra, não nos parece exagero dizer que a reforma – ou deforma – trabalhista se insere na segunda hipótese. Ou seja, entre as falsificações dolosas, praticadas com o propósito de deturpar a realidade, tornando-a, ao mesmo tempo, ainda mais cruel. O legislador não peca apenas por equívocos pontuais, ligeiras distrações ou falta de técnica: substancialmente, ele joga com a fraude. \nAssim é que, conhecendo a quantidade  crescente de contratações de falsos autônomos, ele se aproveita para facilitar a onda,  inventando a figura do “autônomo exclusivo”;  sabendo que  as normas do Direito Civil têm, em regra, um espírito diferente,  suprime as palavras que exigiam compatibilidade para a sua aplicação ao Direito do Trabalho; não ignorando que no Brasil há quase uma tradição de violações à lei, culpa o próprio trabalhador pelo número de ações, e busca diminui-las dificultando o acesso à Justiça. E assim por diante. \nEm tudo, ou em quase tudo, o legislador ignora a lição da melhor doutrina, no sentido de que os princípios do Direito do Trabalho não servem apenas ao intérprete ou aplicador. Eles atuam, ou devem atuar, também no momento pré-jurídico, quando a lei está por fazer, não só inspirando como condicionando os seus autores.  \nA reforma se utiliza ainda, de forma pouco honesta, de alguns elementos do nosso tempo, que celebram a participação, a liberdade e a igualdade. Nesse sentido, revaloriza de várias formas o contrato, seja em nível coletivo, seja em nível individual, mas fazendo de conta que as relações de poder são iguais, exatamente num período histórico em que elas voltaram a ser especialmente desiguais. Portanto, também aqui, fantasia a neutralidade para agir em detrimento do mais fraco. \nMas os efeitos mais destrutivos da nova lei talvez sejam outros.  De um lado, ela acentua a tendência de mercantilização ampla e massiva do trabalho humano e do próprio homem que trabalha, sobretudo por intermédio das terceirizações. De outro, fere profundamente a principal fonte do Direito do Trabalho – ou seja, a luta coletiva – num contexto em que o sindicato já se encontrava fragilizado, em razão de outras tantas causas importantes. \nQuanto ao último aspecto, não custa notar que o Direito do Trabalho, basicamente, foi sempre, em grande parte, construção da classe trabalhadora. Mesmo no Brasil, onde a presença do Estado foi inegavelmente importante, os sindicatos sempre estiveram presentes. De mais a mais, até as normas que importamos no passado trouxeram as marcas do sangue dos operários europeus; assim, seja aqui ou ali, o protegido teceu ou ajudou a tecer a sua própria proteção. \nEsse é, talvez, o traço mais marcante do Direito do Trabalho; é o seu ponto forte, que responde por sua autonomia. No entanto, paradoxalmente, é também esse o seu ponto fraco, o seu Calcanhar de Aquiles. Pois indica que o Direito do Trabalho depende de sindicatos fortes não só para crescer, como para se tornar efetivo, ou seja, para viver. \nAssim, como se vê, a divisão que se costuma fazer, na área trabalhista, entre o Direito Individual e o Coletivo não tem fins apenas didáticos ou metodológicos; nem se  explica só pelo fato de que no primeiro os protagonistas são  empregado e  patrão, e no segundo são a empresa e o sindicato profissional. A diferença maior está em que o Direito Coletivo é instrumento de construção do Direito Individual, seja em termos diretos ou indiretos, seja em termos de preceito como de sanção. \nE a reforma – ou deforma – não age apenas no plano do Direito Positivo. Ela atua também no campo ideológico, e até mesmo no aspecto psicológico, passando a ideia de que o trabalhador já não precisa de proteção, e reforçando a falsa tese de que o Direito do Trabalho prejudica o Direito ao Trabalho. Por essas e por outras, e tal como acontece, hoje, no plano das armas, o Poder Público autoriza tacitamente o empregador a praticar mais violências ainda, descumprindo ainda mais a lei. \nPois bem. Como dizíamos, muito já se escreveu e se disse sobre esse tema – e em várias áreas do conhecimento, do Direito à Sociologia, à História e à Economia. No entanto, poucas vezes se produziu uma mistura de ciências e olhares como a que estamos propondo. \n  \n  \n ","PeriodicalId":432728,"journal":{"name":"Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano","volume":"276 ","pages":"0"},"PeriodicalIF":0.0000,"publicationDate":"2019-07-03","publicationTypes":"Journal Article","fieldsOfStudy":null,"isOpenAccess":false,"openAccessPdf":"","citationCount":"0","resultStr":"{\"title\":\"Dossiê “Significado e impactos da reforma trabalhista no mundo do trabalho”\",\"authors\":\"José Dari Krein, Márcio Túlio Viana\",\"doi\":\"10.33239/RTDH.V2I1.46\",\"DOIUrl\":null,\"url\":null,\"abstract\":\"Muito já foi dito e escrito sobre a reforma trabalhista. O próprio termo “reforma” já passou por uma espécie de reforma: há os que o escrevem com aspas, enquanto outros o traduzem por “deforma”, ou seja, exatamente pelo seu oposto. \\nNa verdade, o nosso tempo não inventou apenas os clones de ovelhas, mas tem produzido falsificações de todo tipo. 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摘要

关于劳动改革已经说了很多,写了很多。“改革”这个词本身已经经历了一种改革:有些人用引号写它,而另一些人用“扭曲”来翻译它,换句话说,完全相反。事实上,我们这个时代不仅发明了克隆羊,还制造了各种各样的假货。许多是直率和天真的,就像模仿披头士的乐队一样。其他的则是隐藏的和狡猾的,比如在秘密的后院制造的名牌运动鞋。在后一种赝品中,也有无形的、不可触摸的赝品,例如,一个政客假装是民主主义者,却鼓励暴力;或者像报道事故一样报道环境犯罪的媒体。假新闻的机会可以包括雪崩闯入全国说服群众在荷兰的婴儿是训练性在巴西或者老师一直进行实践活动,鼓励“混乱”,共产主义革命甚至恋童癖。现在,毫不夸张地说,劳动改革——或扭曲——属于第二种假设。换句话说,在蓄意伪造之间,目的是歪曲现实,同时使现实更加残酷。立法者并不仅仅因为偶尔的错误、轻微的分心或缺乏技巧而犯错误:本质上,他是在玩欺诈游戏。因此,他知道越来越多的虚假自营职业者被雇佣,他利用这个机会促进了这一浪潮,创造了“独家自营职业者”的形象;意识到民法规则通常具有不同的精神,它删除了在适用于劳动法时需要兼容的词语;考虑到巴西几乎有违法的传统,将行为的数量归咎于工人自己,并试图通过阻碍司法公正来减少这些行为。等等,等等。在每一件事上,或几乎每一件事上,立法者都忽视了最好的学说的教训,即劳动法的原则不仅服务于解释者或适用者。它们也在法律制定之前的时刻采取行动,或必须采取行动,不仅激励和制约其作者。改革仍然不诚实地使用我们这个时代的一些庆祝参与、自由和平等的元素。从这个意义上说,它以各种方式重新评估契约,无论是在集体层面还是在个人层面,但假设权力关系是平等的,在一个历史时期,它们再次变得特别不平等。因此,在这方面,它也幻想中立,以损害弱者的利益。但新法律最具破坏性的影响可能是其他方面的。一方面,它强调了人类劳动和劳动者本身广泛而大规模的商品化趋势,特别是通过外包。另一方面,它严重损害了劳动法的主要来源- -即集体斗争- -在工会已经被许多其他重要原因削弱的情况下。至于最后一个方面,不难注意到,劳动法基本上一直是工人阶级的建设。即使在国家的存在不可否认很重要的巴西,工会也一直存在。此外,即使是我们过去引进的标准也带有欧洲工人血液的印记;所以,在这里或那里,被保护的人编织或帮助编织了他自己的保护。这也许是劳动法最显著的特点;这是它的优点,也是它的自主性。然而,矛盾的是,这也是它的弱点,它的阿喀琉斯之踵。因为它表明,劳动法依赖于强大的工会,不仅要发展,而且要变得有效,换句话说,要生存。因此,正如我们所看到的,在劳动领域中,个人权利和集体权利之间的划分不仅具有教学或方法目的;在第一个案例中,主角是雇员和雇主,而在第二个案例中,主角是公司和工会。最大的区别在于,集体法是构建个人权利的工具,无论是直接的还是间接的,还是在规则和制裁方面。改革——或扭曲——不仅在实在法层面起作用。它还在意识形态领域,甚至在心理方面发挥作用,传递工人不再需要保护的想法,并强化了劳动法损害工作权利的错误论点。 由于这些和其他原因,就像今天的情况一样,在武器方面,政府默许雇主实施更多的暴力,进一步违反法律。好吧。正如我们所说,关于这个问题已经写了很多,说了很多——在各个知识领域,从法律到社会学、历史到经济学。然而,像我们所提议的那样,科学和观点的混合很少出现。
本文章由计算机程序翻译,如有差异,请以英文原文为准。
Dossiê “Significado e impactos da reforma trabalhista no mundo do trabalho”
Muito já foi dito e escrito sobre a reforma trabalhista. O próprio termo “reforma” já passou por uma espécie de reforma: há os que o escrevem com aspas, enquanto outros o traduzem por “deforma”, ou seja, exatamente pelo seu oposto. Na verdade, o nosso tempo não inventou apenas os clones de ovelhas, mas tem produzido falsificações de todo tipo. Muitas são explícitas e inocentes, como acontece com os grupos que imitam os Beatles. Outras são ocultas e dolosas, como o tênis de marca fabricado num quintal clandestino.  Entre essas últimas falsificações se inserem, também, as imateriais, não palpáveis, como, por exemplo, no caso do político que se faz de democrata mas incentiva a violência; ou no da imprensa que noticia um crime ambiental como se fosse um acidente. Na mesma hipótese poderíamos incluir a avalanche de fake news que invadiu o País, a ponto de convencer multidões de que na Holanda os bebês são treinados para o sexo ou no Brasil os professores têm trocado a atividade de pesquisa por práticas como o incentivo à “baderna”, à revolução comunista e até mesmo à pedofilia. Ora, não nos parece exagero dizer que a reforma – ou deforma – trabalhista se insere na segunda hipótese. Ou seja, entre as falsificações dolosas, praticadas com o propósito de deturpar a realidade, tornando-a, ao mesmo tempo, ainda mais cruel. O legislador não peca apenas por equívocos pontuais, ligeiras distrações ou falta de técnica: substancialmente, ele joga com a fraude. Assim é que, conhecendo a quantidade  crescente de contratações de falsos autônomos, ele se aproveita para facilitar a onda,  inventando a figura do “autônomo exclusivo”;  sabendo que  as normas do Direito Civil têm, em regra, um espírito diferente,  suprime as palavras que exigiam compatibilidade para a sua aplicação ao Direito do Trabalho; não ignorando que no Brasil há quase uma tradição de violações à lei, culpa o próprio trabalhador pelo número de ações, e busca diminui-las dificultando o acesso à Justiça. E assim por diante. Em tudo, ou em quase tudo, o legislador ignora a lição da melhor doutrina, no sentido de que os princípios do Direito do Trabalho não servem apenas ao intérprete ou aplicador. Eles atuam, ou devem atuar, também no momento pré-jurídico, quando a lei está por fazer, não só inspirando como condicionando os seus autores.  A reforma se utiliza ainda, de forma pouco honesta, de alguns elementos do nosso tempo, que celebram a participação, a liberdade e a igualdade. Nesse sentido, revaloriza de várias formas o contrato, seja em nível coletivo, seja em nível individual, mas fazendo de conta que as relações de poder são iguais, exatamente num período histórico em que elas voltaram a ser especialmente desiguais. Portanto, também aqui, fantasia a neutralidade para agir em detrimento do mais fraco. Mas os efeitos mais destrutivos da nova lei talvez sejam outros.  De um lado, ela acentua a tendência de mercantilização ampla e massiva do trabalho humano e do próprio homem que trabalha, sobretudo por intermédio das terceirizações. De outro, fere profundamente a principal fonte do Direito do Trabalho – ou seja, a luta coletiva – num contexto em que o sindicato já se encontrava fragilizado, em razão de outras tantas causas importantes. Quanto ao último aspecto, não custa notar que o Direito do Trabalho, basicamente, foi sempre, em grande parte, construção da classe trabalhadora. Mesmo no Brasil, onde a presença do Estado foi inegavelmente importante, os sindicatos sempre estiveram presentes. De mais a mais, até as normas que importamos no passado trouxeram as marcas do sangue dos operários europeus; assim, seja aqui ou ali, o protegido teceu ou ajudou a tecer a sua própria proteção. Esse é, talvez, o traço mais marcante do Direito do Trabalho; é o seu ponto forte, que responde por sua autonomia. No entanto, paradoxalmente, é também esse o seu ponto fraco, o seu Calcanhar de Aquiles. Pois indica que o Direito do Trabalho depende de sindicatos fortes não só para crescer, como para se tornar efetivo, ou seja, para viver. Assim, como se vê, a divisão que se costuma fazer, na área trabalhista, entre o Direito Individual e o Coletivo não tem fins apenas didáticos ou metodológicos; nem se  explica só pelo fato de que no primeiro os protagonistas são  empregado e  patrão, e no segundo são a empresa e o sindicato profissional. A diferença maior está em que o Direito Coletivo é instrumento de construção do Direito Individual, seja em termos diretos ou indiretos, seja em termos de preceito como de sanção. E a reforma – ou deforma – não age apenas no plano do Direito Positivo. Ela atua também no campo ideológico, e até mesmo no aspecto psicológico, passando a ideia de que o trabalhador já não precisa de proteção, e reforçando a falsa tese de que o Direito do Trabalho prejudica o Direito ao Trabalho. Por essas e por outras, e tal como acontece, hoje, no plano das armas, o Poder Público autoriza tacitamente o empregador a praticar mais violências ainda, descumprindo ainda mais a lei. Pois bem. Como dizíamos, muito já se escreveu e se disse sobre esse tema – e em várias áreas do conhecimento, do Direito à Sociologia, à História e à Economia. No entanto, poucas vezes se produziu uma mistura de ciências e olhares como a que estamos propondo.      
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