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Abstract
A divisão entre submersos e salvos revela-se a divisão-chave da visão de mundo de Primo Levi. O “submerso interno” (Di Castro) presente em todo sobrevivente se desdobra no submerso como Doppelgänger, uma voz interna que impulsiona o testemunho e que no escritor encontra sua representação narrativa, oscilante entre a metáfora da ameaça de uma sombra persecutória (presente na produção poética) e a personagem do amigo-duplo Alberto, companheiro desaparecido.A urgência do testemunho se desdobra na questão de como representar os submersos, os únicos que desceram até o fundo e poderiam devolver um testemunho realmente integral. Contudo, o escritor encontra uma “palavra sobrevivente” (Derrida) para aprofundar as facetas da vergonha, interrogar os fantasmas da culpa e delinear a “zona cinzenta”. Diante desta ferida insanável, Levi recusa a ideia de um privilégio merecido, nem precisa do conforto de uma providência divina: vários fatores contribuíram à sua salvação, mas as forças que operam são o acaso e a sorte. Já que a Fortuna, como salienta Robert Gordon, é uma força mítica que nossa cultura sempre utilizou para lidar com a realidade incompreensível e incontrolável, no caso do sobrevivente ela preenche a ausência angustiante de explicações; em Levi torna-se ponto de apoio para compor a representação literária dos eventos.A sobrevivência é, portanto, da ordem do “estranho”. Origem, evolução, adaptação, seleção natural, embate entre ordem e caos confluem no conto “Carbono” e demonstram que afinal o polo de maior atração de toda sua produção é o quesito: quem sobrevive e por quê?