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Abstract
Neste artigo, buscamos estudar a ocorrência do termo νόστος no poema Alexandra, de Lícofron. Numa primeira mirada, o poema parece povoado pelos vários retornos dos gregos, terminada a guerra em Troia; olhando-o mais de perto, porém, descobre-se que o Alexandra entretece, antes, os seus não-retornos, visto que sempre o naufrágio ou a catástrofe acomete os retornantes helenos. O motivo dessa reversão, achamo-lo na sina da própria narradora do poema, Alexandra-Cassandra: tendo sido estuprada por Ájax, teve seu ultraje vingado por Atena, em cujo templo a violência foi perpetrada. Assim, a agressão sofrida por Cassandra reverbera no futuro, causando a ruína de muitos gregos. Fazendo um pequeno desvio em nossa rota, encontramos em Freud, na sua descrição do trauma, o retorno de uma situação irreversível e disruptiva, que reverbera no futuro: o sujeito traumatizado é compelido a retornar repetidamente à situação traumática. Trata-se de um esquema similar ao da narrativa de Lícofron, mas, se em Freud a repetição se opera previamente à palavra, no poema helenístico o que se tem é uma pletora quase incompreensível de palavras (as profecias de Cassandra). Estaríamos, assim, entre dois extremos da linguagem – entre eles, o trauma, a sina, e o retorno impossível à coisa que nos obriga a dizer qualquer coisa.