{"title":"Democratização e segurança","authors":"F. K. Comparato","doi":"10.48143/rdai/08.fkc","DOIUrl":null,"url":null,"abstract":"I – As definições \nO primeiro dever de lealdade do intelectual é a clareza nas ideias, sobretudo quando elas se traduzem naquilo que os lógicos dominaram conceitos mentais, isto é, ideias que servem de instrumento para a apreensão da realidade.1-2 À falta de um sentido unívoco amplamente aceito para esses conceitos, importa explicar em que acepção eles são utilizados: ou seja, apresentar, desde o início da exposição, não uma definição essencial – válida para sempre e em todas as hipóteses – mas uma definição estipulativa, como dizem os semióticos anglo-saxões. Importa, em suma, que o expositor esclareça, preambularmente, em que sentido vai usar conceitos-chave da sua exposição (ou “discurso”), no jargão atual), sem pretender impor esse sentido a outrem, fora do contexto expositivo. \nDo binômio que compõe o tema deste ensaio, a segurança oferece um passado de elaborações doutrinais muito mais tradicional, em Direito, do que o de democratização. Sem dúvida, porque o problema da segurança é inerente a toda e qualquer experiência jurídica, enquanto a democracia é fenômeno político recente, mesmo na História ocidental, sendo contestável a filiação da experiencia democrática moderna à vida ateniense do Século 8º ao Século 4º, a.C. \nComecemos, pois, pela definição da segurança em suas diferentes manifestações. \nA pesquisa etimológica nos desvenda o núcleo significante do vocábulo: se (no caso, prefixo privativo, síncope de sine) e cura, isto é, cuidado, resguardo, cautela, precaução, preocupação. A ideia central de segurança expressa a tranquilidade, aquietação. No campo ético-jurídico, a segurança traduz a posse tranquila – isto é, livre de perigos – de um bem, uma posição, uma relação social. O que nos dá o sentimento e a situação objetiva dessa posse tranquila é a eliminação ou, pelo menos, o controle dos riscos suscetíveis de afetá-la; ou seja, a garantia. Garantia e segurança são, portanto, termos correlatos. Na linguagem do direito privado, aliás, fala-se indistintamente, em garantia e segurança. Assim, por exemplo, o Código Civil (LGL\\2002\\400) dispõe em seu art. 762, - I que: “a dívida considera-se vencida se, deteriorando-se, ou depreciando-se a coisa dada em segurança, desfalcar a garantia, e o devedor, intimado, a não reforçar”. \nÉ, justamente, pela qualidade da garantia que se define a natureza da segurança. Há, com efeito, garantia de fato e garantias de direito. A elas correspondem seguranças fáticas – fundadas na força física, no poder econômico, na capacidade de sedução e assim por diante – seguranças jurídicas, reguladas no sentido de serem suscetíveis de produzir efeitos de direito no interesse do respectivo sujeito, nem sempre são efetivas, a ponto de proteger, real e completamente, os seus interesses. Põe-se, nesse particular, o constante e fundamental problema das relações entre o ser o dever ser, que não pode ser resolvido em termos de separação absoluta, como pretendeu Hans Kelsen e sua escola, nem sob a forma de um reducionismo unilateral, dos fatos do Direito – como preconizaram os jusnaturalistas – ou então, pelo contrário, do Direito dos fatos – como pareceu a alguns juristas modernos, como Karl Olivecrona. A relação entre fatos e normas, entre ser e dever ser, compõe uma dialética integrativa insuprimível. As instituições jurídicas existem enquanto valem, normativamente, no mundo dos fatos. O Direito é obviamente norma ou dever ser. Mas uma ordem normativa puramente ideal, ou confinada à letra das leis, é um fantasma, como dizia Jhering. \nAssim, não há segurança jurídica que não tenha, ainda que em grau mínimo, uma existência efetiva. \nOra, sob o aspecto da certeza de aplicação da norma, a segurança é uma dimensão essencial do Direito. Indagar o fundamento último da segurança jurídica (em razão de que existe ela?) equivale a perquirir o próprio fundamento do Direito. \nNão creio simplificar excessivamente o panorama histórico do pensamento ocidental, dizendo que as respostas a essa indagação podem ser classificadas em três grandes correntes. \nHá os que identificam no poder efetivo, no controle incontestável das ações humanas o fundamento último da segurança jurídica. Hobbes é, sem dúvida, o primeiro e maior expoente dessa corrente de pensamento na idade moderna. Ele reconhece em cada homem o direito natural à própria sobrevivência e à satisfação de seus elementares interesses. É nisso que nos revelamos como seres sujeitos à lei comum da natureza. Mas esta lei natural conduz necessariamente, como no reino animal, a um estado de guerra permanente de todos contra todos, ao salve-se quem puder; em uma palavra, à insegurança coletiva, geradora da autodestruição. A supressão desse estado de guerra, que é a miserável condição do homem enquanto animal, exige uma auto-restrição dos direitos naturais de cada um, constituindo-se acima de todos um Poder – sob a forma de um monarca ou uma assembleia – encarregado de zela pela segurança de todos e de cada qual. Todas as normas emanadas desse Poder, no interesse da segurança coletiva, são legítimas; e ninguém pode alegar direitos individuais que entrem em conflito com as normas ditadas pelo Poder, no exercício de sua função máxima3. \nA segunda grande corrente de pensamento que procurou responder a indagação sobre o fundamento da segurança jurídica é o consensualismo. Ele principia com Rousseau, que por sua vez remonta ao própria Hobbes. Rousseau aceita a análise de Hobbes – que, de resto, era comum a todos os pensadores ocidentais dos Séculos XVII e XVIII – da radical oposição entre o estado de natureza e o estado de direito. Reconhece também, com ele, que o estado de natureza é o domínio da insegurança geral e que os homens se unem juridicamente em sociedade para assegurar sua sobrevivência, mediante alienação – de todos para todos – de uma parcela de sua soberania individual. Mas – e aí vai o grande desvio em relação a Hobbes e a especial contribuição de Rousseau – essa fundação jurídica da sociedade não constitui um Poder personalizado, acima dos homens. Constitui, isto sim, um soberano coletivo – o conjunto dos homens naturais, tornados cidadão (homens civis) – cujas deliberações se pautam pela regra absoluta da vontade geral. Esta não representa a soma de vontades individuais quaisquer, nem mesmo a unanimidade destas; mas é a vontade dos cidadãos submetida ao pacto fundamental da sociedade civil, cuja razão de ser é a preservação dos sócios, libertos da lei natural. A segurança jurídica funda-se, pois, em última análise, no consentimento dos homens, geralmente manifestado após a fundação da sociedade civil, pela deliberação majoritária, mas que, pelo menos uma vez, isto é, no momento mesmo dessa fundação da sociedade civil, foi unânime. Por isso mesmo, Rousseau não admitia, como sabido, o sistema representativo de governo. \nE há também, por fim, o conjunto dos adeptos da explicação transcendentalista, os que preferem fundar a segurança jurídica, não no Poder nem tampouco no consenso social, mas em valores que transcendem as vicissitudes históricas de um e de outro. São as explicações da segurança jurídica pela lei divina, a razão natural, ou os valores sociais, supremos e imutáveis. A segurança do Direito provém de sua conformidade com a justiça, que não é definida pelo soberano – seja ele um monarca, uma assembleia ou o próprio povo – mas traçada pela razão, divina ou humana. \nO unilateralismo dessas concepções já não escapa a ninguém. Mas é difícil negar a parte de verdade que cada uma delas encerra. \nA irrecusabilidade do poder, como elemento componente de toda sociedade, em necessária contraposição ao conjunto dos sócios ou governados, é inegável. A reusa dessa verdade, numa concepção de democratismo radical, conduz fatalmente à decomposição anárquica ou à exacerbação totalitária. Mas o poder não é fundamento último da segurança, como não é fundamento do Direito. Ele é, meramente, o instrumento de sua imposição. O Direito não deve ser obedecido em nome do poder, mas a outro título, que justifica o próprio poder. \nEsse título justificativo de toda a ordem jurídica só pode ser a pessoa humana, como fonte universal de valores; a pessoa, que não é um ser abstrato, existindo fora das dimensões determinantes de tempo e espaço, mas um ente submetido aos condicionamentos concretos da vida histórica. Não há, portanto, valores humanos que transcendam a História. \nO consensualismo, que engendrou politicamente o princípio da soberania popular, explicita uma boa parte da verdade quando funda a ordem jurídica na deliberação majoritária. Pois há, sempre, maior probabilidade de que os valores essenciais da pessoa humana sejam expressos pela maioria e não pelas minorias. É óbvio, no entanto, que essa probabilidade nunca é certeza e a massa pode também ser objeto de grandes manipulações. Daí por que se deve entender a democracia como o regime fundado tanto na lei da maioria, quanto no respeito aos direitos individuais. O princípio majoritário, por si só, não protege as democracias da decadência demagógica, ou dos abusos da maioria. \nComo se vê, a discussão do primeiro termo do binômio “segurança e democratização” leva naturalmente ao âmbito de indagações compreendidas no segundo termo. O que mostra a indissociável correlação das ideias. \nFalta, no entanto, para se completar esta rápida disquisição sobre a segurança, analisar os seus sujeitos. Em termos práticos e para simplificar a questão, é de se indagar quem tem direito à segurança. \nA resposta a essa questão, por mais banal que pareça, exige se compreenda, preliminarmente, que toda situação de segurança existe contra algo ou alguém, diante de um perigo concretizado em fatos da natureza ou ações humanas. Classicamente, afirma-se que os indivíduos têm direito a uma vida segura diante dos outros indivíduos ou do poder estatal (perspectiva do direito interno, na interpretação da filosofia liberal) e que as nações têm direito à segurança, umas perante as demais. 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Abstract
I – As definições
O primeiro dever de lealdade do intelectual é a clareza nas ideias, sobretudo quando elas se traduzem naquilo que os lógicos dominaram conceitos mentais, isto é, ideias que servem de instrumento para a apreensão da realidade.1-2 À falta de um sentido unívoco amplamente aceito para esses conceitos, importa explicar em que acepção eles são utilizados: ou seja, apresentar, desde o início da exposição, não uma definição essencial – válida para sempre e em todas as hipóteses – mas uma definição estipulativa, como dizem os semióticos anglo-saxões. Importa, em suma, que o expositor esclareça, preambularmente, em que sentido vai usar conceitos-chave da sua exposição (ou “discurso”), no jargão atual), sem pretender impor esse sentido a outrem, fora do contexto expositivo.
Do binômio que compõe o tema deste ensaio, a segurança oferece um passado de elaborações doutrinais muito mais tradicional, em Direito, do que o de democratização. Sem dúvida, porque o problema da segurança é inerente a toda e qualquer experiência jurídica, enquanto a democracia é fenômeno político recente, mesmo na História ocidental, sendo contestável a filiação da experiencia democrática moderna à vida ateniense do Século 8º ao Século 4º, a.C.
Comecemos, pois, pela definição da segurança em suas diferentes manifestações.
A pesquisa etimológica nos desvenda o núcleo significante do vocábulo: se (no caso, prefixo privativo, síncope de sine) e cura, isto é, cuidado, resguardo, cautela, precaução, preocupação. A ideia central de segurança expressa a tranquilidade, aquietação. No campo ético-jurídico, a segurança traduz a posse tranquila – isto é, livre de perigos – de um bem, uma posição, uma relação social. O que nos dá o sentimento e a situação objetiva dessa posse tranquila é a eliminação ou, pelo menos, o controle dos riscos suscetíveis de afetá-la; ou seja, a garantia. Garantia e segurança são, portanto, termos correlatos. Na linguagem do direito privado, aliás, fala-se indistintamente, em garantia e segurança. Assim, por exemplo, o Código Civil (LGL\2002\400) dispõe em seu art. 762, - I que: “a dívida considera-se vencida se, deteriorando-se, ou depreciando-se a coisa dada em segurança, desfalcar a garantia, e o devedor, intimado, a não reforçar”.
É, justamente, pela qualidade da garantia que se define a natureza da segurança. Há, com efeito, garantia de fato e garantias de direito. A elas correspondem seguranças fáticas – fundadas na força física, no poder econômico, na capacidade de sedução e assim por diante – seguranças jurídicas, reguladas no sentido de serem suscetíveis de produzir efeitos de direito no interesse do respectivo sujeito, nem sempre são efetivas, a ponto de proteger, real e completamente, os seus interesses. Põe-se, nesse particular, o constante e fundamental problema das relações entre o ser o dever ser, que não pode ser resolvido em termos de separação absoluta, como pretendeu Hans Kelsen e sua escola, nem sob a forma de um reducionismo unilateral, dos fatos do Direito – como preconizaram os jusnaturalistas – ou então, pelo contrário, do Direito dos fatos – como pareceu a alguns juristas modernos, como Karl Olivecrona. A relação entre fatos e normas, entre ser e dever ser, compõe uma dialética integrativa insuprimível. As instituições jurídicas existem enquanto valem, normativamente, no mundo dos fatos. O Direito é obviamente norma ou dever ser. Mas uma ordem normativa puramente ideal, ou confinada à letra das leis, é um fantasma, como dizia Jhering.
Assim, não há segurança jurídica que não tenha, ainda que em grau mínimo, uma existência efetiva.
Ora, sob o aspecto da certeza de aplicação da norma, a segurança é uma dimensão essencial do Direito. Indagar o fundamento último da segurança jurídica (em razão de que existe ela?) equivale a perquirir o próprio fundamento do Direito.
Não creio simplificar excessivamente o panorama histórico do pensamento ocidental, dizendo que as respostas a essa indagação podem ser classificadas em três grandes correntes.
Há os que identificam no poder efetivo, no controle incontestável das ações humanas o fundamento último da segurança jurídica. Hobbes é, sem dúvida, o primeiro e maior expoente dessa corrente de pensamento na idade moderna. Ele reconhece em cada homem o direito natural à própria sobrevivência e à satisfação de seus elementares interesses. É nisso que nos revelamos como seres sujeitos à lei comum da natureza. Mas esta lei natural conduz necessariamente, como no reino animal, a um estado de guerra permanente de todos contra todos, ao salve-se quem puder; em uma palavra, à insegurança coletiva, geradora da autodestruição. A supressão desse estado de guerra, que é a miserável condição do homem enquanto animal, exige uma auto-restrição dos direitos naturais de cada um, constituindo-se acima de todos um Poder – sob a forma de um monarca ou uma assembleia – encarregado de zela pela segurança de todos e de cada qual. Todas as normas emanadas desse Poder, no interesse da segurança coletiva, são legítimas; e ninguém pode alegar direitos individuais que entrem em conflito com as normas ditadas pelo Poder, no exercício de sua função máxima3.
A segunda grande corrente de pensamento que procurou responder a indagação sobre o fundamento da segurança jurídica é o consensualismo. Ele principia com Rousseau, que por sua vez remonta ao própria Hobbes. Rousseau aceita a análise de Hobbes – que, de resto, era comum a todos os pensadores ocidentais dos Séculos XVII e XVIII – da radical oposição entre o estado de natureza e o estado de direito. Reconhece também, com ele, que o estado de natureza é o domínio da insegurança geral e que os homens se unem juridicamente em sociedade para assegurar sua sobrevivência, mediante alienação – de todos para todos – de uma parcela de sua soberania individual. Mas – e aí vai o grande desvio em relação a Hobbes e a especial contribuição de Rousseau – essa fundação jurídica da sociedade não constitui um Poder personalizado, acima dos homens. Constitui, isto sim, um soberano coletivo – o conjunto dos homens naturais, tornados cidadão (homens civis) – cujas deliberações se pautam pela regra absoluta da vontade geral. Esta não representa a soma de vontades individuais quaisquer, nem mesmo a unanimidade destas; mas é a vontade dos cidadãos submetida ao pacto fundamental da sociedade civil, cuja razão de ser é a preservação dos sócios, libertos da lei natural. A segurança jurídica funda-se, pois, em última análise, no consentimento dos homens, geralmente manifestado após a fundação da sociedade civil, pela deliberação majoritária, mas que, pelo menos uma vez, isto é, no momento mesmo dessa fundação da sociedade civil, foi unânime. Por isso mesmo, Rousseau não admitia, como sabido, o sistema representativo de governo.
E há também, por fim, o conjunto dos adeptos da explicação transcendentalista, os que preferem fundar a segurança jurídica, não no Poder nem tampouco no consenso social, mas em valores que transcendem as vicissitudes históricas de um e de outro. São as explicações da segurança jurídica pela lei divina, a razão natural, ou os valores sociais, supremos e imutáveis. A segurança do Direito provém de sua conformidade com a justiça, que não é definida pelo soberano – seja ele um monarca, uma assembleia ou o próprio povo – mas traçada pela razão, divina ou humana.
O unilateralismo dessas concepções já não escapa a ninguém. Mas é difícil negar a parte de verdade que cada uma delas encerra.
A irrecusabilidade do poder, como elemento componente de toda sociedade, em necessária contraposição ao conjunto dos sócios ou governados, é inegável. A reusa dessa verdade, numa concepção de democratismo radical, conduz fatalmente à decomposição anárquica ou à exacerbação totalitária. Mas o poder não é fundamento último da segurança, como não é fundamento do Direito. Ele é, meramente, o instrumento de sua imposição. O Direito não deve ser obedecido em nome do poder, mas a outro título, que justifica o próprio poder.
Esse título justificativo de toda a ordem jurídica só pode ser a pessoa humana, como fonte universal de valores; a pessoa, que não é um ser abstrato, existindo fora das dimensões determinantes de tempo e espaço, mas um ente submetido aos condicionamentos concretos da vida histórica. Não há, portanto, valores humanos que transcendam a História.
O consensualismo, que engendrou politicamente o princípio da soberania popular, explicita uma boa parte da verdade quando funda a ordem jurídica na deliberação majoritária. Pois há, sempre, maior probabilidade de que os valores essenciais da pessoa humana sejam expressos pela maioria e não pelas minorias. É óbvio, no entanto, que essa probabilidade nunca é certeza e a massa pode também ser objeto de grandes manipulações. Daí por que se deve entender a democracia como o regime fundado tanto na lei da maioria, quanto no respeito aos direitos individuais. O princípio majoritário, por si só, não protege as democracias da decadência demagógica, ou dos abusos da maioria.
Como se vê, a discussão do primeiro termo do binômio “segurança e democratização” leva naturalmente ao âmbito de indagações compreendidas no segundo termo. O que mostra a indissociável correlação das ideias.
Falta, no entanto, para se completar esta rápida disquisição sobre a segurança, analisar os seus sujeitos. Em termos práticos e para simplificar a questão, é de se indagar quem tem direito à segurança.
A resposta a essa questão, por mais banal que pareça, exige se compreenda, preliminarmente, que toda situação de segurança existe contra algo ou alguém, diante de um perigo concretizado em fatos da natureza ou ações humanas. Classicamente, afirma-se que os indivíduos têm direito a uma vida segura diante dos outros indivíduos ou do poder estatal (perspectiva do direito interno, na interpretação da filosofia liberal) e que as nações têm direito à segurança, umas perante as demais. O que tem sido menos sublinhado é que entre o indiví