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Cristhian Teófilo da Silva
{"title":"提交","authors":"Cristhian Teófilo da Silva","doi":"10.26512/interethnica.v21i2.12247","DOIUrl":null,"url":null,"abstract":"Estudos e pesquisas entre povos indígenas nas Américas tem assinalado a permanência das dinâmicas neocoloniais de exploração de suas populações, territórios e recursos colocando em questão a efetividade dos direitos reconhecidos nacional e internacionalmente nas últimas duas décadas do século XX. A conjuntura política e econômica adversa no início deste novo século tem configurado um quadro de virtual retrocesso e desconstrução dos direitos originários dos povos indígenas. Por esta razão, refletir sobre o poder e as formas contemporâneas de resistência aos processos que se pretendem reincidentes na aniquilação da diversidade sociocultural faz-se uma exigência ao mesmo tempo ética e política, além de epistêmica, no atual momento. \nConsiderando a urgência de uma reflexão crítica, comparativa, multidisciplinar e regional para fazer frente à complexidade das relações interétnicas no século XXI, este dossiê foi proposto com vistas a fomentar a visibilidade e trocas de dados e análises a partir de pesquisas recentes, empiricamente embasadas e teoricamente inovadoras, além de reflexões críticas que contribuam para o debate das relações de poder e das formas e práticas de resistência indígena no âmbito da política interétnica na América Latina. \nO dossiê reuniu quatro pesquisas e um estudo abrangendo as lutas indígenas em Oaxaca no México, no altiplano e no chaco bolivianos e em Roraima no Brasil. Desta maneira, temos quatro macrorregiões latino-americanas metonimicamente representadas, respectivamente, a Mesoamérica, os Andes, o Chaco e as savanas das guianas ou “lavrado”. Por fim, apresenta um diálogo teórico que aproxima a análise do Sistema Mundo e a perspectiva decolonial para promover uma abordagem de longa duração à violência e resistência indígena no Brasil. Os trabalhos, em conjunto, iluminam aspectos jurídicos das legislações indigenistas nacionais e das convenções e tratados internacionais sobre o direito de consulta entre os povos indígenas; problematizam a história das relações interétnicas envolvendo povos indígenas, estados e sociedades nacionais; tematizam a centralidade da educação para formação política e para a elaboração de projetos interculturais possíveis para assegurar o futuro e a autonomia dos povos indígenas; e percorrem, com profusão de dados etnográficos, questões etnológicas e etnohistóricas complexas que demonstram a sofisticação do pensamento político indígena contemporâneo. \nIndividualmente, cada artigo apresenta uma variação das múltiplas e sempre reelaboradas formas de resistência indígena em um mundo em permanente transformação e risco de retroagir em suas formas estatais e neoliberais de se relacionar com a diversidade étnica e cultural. No artigo “A comunalidad como dinâmica anticolonialista e epistêmica em Oaxaca/México”, Clarissa Noronha Melo Tavares, doutora em Ciências Sociais, descreve etnograficamente o contexto de luta e resistência coletiva indígena frente às tentativas de instalação de um megaprojeto de energia eólica nos territórios indígenas. Para sua descrição, serve-se do próprio ideal organizativo comunitário, definido pela ideia de comunalidad, como fio condutor de sua narrativa. Desse modo, a autora evita incorrer nos abusos da autoridade etnográfica dando primazia às concepções indígenas para alinhavar os dados de campo. Parafraseando Marcel Mauss, depreende-se de seu texto de que forma a comunalidad assume contornos de um “fato social comunal”, responsável por um processo intenso de ressacralização do território que ressignifica, dentre outros entes naturais, o vento como força vital para que o mesmo não seja convertido em mercadoria. \nO artigo seguinte, “Consciência identitária, autonomia, participação e consulta: Caminhos para superação de práticas coloniais”, de Thiago Almeida Garcia, também doutor em Ciências Sociais, parte de pesquisas comparadas sobre situações sociais internacionais de discussão sobre o direito de consulta prévia e entrevistas com lideranças indígenas sul-americanas, sobretudo do Brasil e Bolívia, para apreender estas situações como arenas políticas onde são disputados o sentido e o controle do que vem a ser um “direito de consulta”. Destacam-se duas posições ideológicas. A primeira, originada no contexto institucional burocratizado e tutelar dos Estados nacionais. E, a segunda, originada no direito à autodeterminação conquistado pelos povos indígenas nas décadas de 80 e 90 do século passado. Dos embates entre estas perspectivas, as “relações entre povos indígenas, Estados e sociedades nacionais têm raízes profundas, que acionam memórias coletivas guardadas em depósitos coloniais”. Deste modo, Thiago Almeida Garcia compreende que as lutas e resistências indígenas se fazem necessárias até mesmo nas situações de construção de seus direitos e nas tentativas de viabilizar sua efetivação no âmbito internacional. Segundo Thiago Almeida Garcia: “Mais do que nos arcabouços jurídicos ou nos discursos proferidos em instâncias internacionais, são nas situações em que os direitos indígenas ‘ameaçam’ ou ‘travam’ ações estratégicas estatais que se pode identificar quais são os posicionamentos governamentais e as visões da sociedade sobre os povos indígenas”. Ou seja, a cena internacional mostra-se longe de estabelecer a eticidade discursiva imprescindível para o diálogo interétnico, como preconizava Roberto Cardoso de Oliveira. \nO terceiro artigo, “Terra, luta e (trans)formação no movimento indígena de Roraima”, de João Francisco Kleba Lisboa, doutor em Antropologia Social, compreende a resistência indígena a partir da centralidade dos processos educacionais para a formação política de intelectuais e lideranças indígenas, assim como, de novas gerações de Makuxi e Wapichana, anteriormente submetidos à regimes de dominação e exploração escravagista. O que o autor propõe “é ver a escola indígena como um motor de transformação, mas não nos moldes daquilo que o Ocidente passou a conceber como ‘transformação histórica’, um processo inexorável no tempo (...)”. Segundo ele, é a própria transformação que passa a ser transformada, de um processo de assimilação etnocida para um movimento de construção da autonomia. A etnografia que serve de base para o artigo demonstra eficazmente de que modo os povos indígenas se utilizam de instituições e conceitos da sociedade nacional, como “escola” e “educação”, que em nossas sociedades voltam-se para a formação de indivíduos adaptados a uma economia de mercado, para construir projetos coletivos de formação de lideranças e difundir valores e sentimentos indígenas necessários à recuperação do território e sustentabilidade de seus povos e aldeias. \nNo artigo de Sandra Nascimento, doutora em Ciências Sociais, e Ana Catarina Zema Resende, doutora em História, intitulado: “Lógicas do Sistema Mundo moderno/colonial e violências contra os povos indígenas no Brasil”, as autoras desenvolvem “uma proposta de reflexão teórica para o enquadramento da violência histórica cometida contra os povos indígenas no Brasil a partir do diálogo com a perspectiva de análise do Sistema Mundo moderno/colonial”.   O artigo vem ao encontro, portanto, de preocupações teóricas e metodológicas recentes que reivindicam o estudo das violências praticadas contra os povos indígenas a partir de perspectivas que sejam capazes de articular processos macro-históricos com situações micro-sociológicas, de modo a abarcarmos a acumulação de violências historicamente cometidas como decisiva para a persistente vulnerabilidade em que se encontram os povos indígenas nos dias de hoje. Segundo as autoras, “o fato dos povos indígenas de todo mundo terem vivenciado experiências semelhantes de violações de seus direitos mostra que o que lhes acontece é sobredeterminado pelas dinâmicas do Sistema Mundo moderno/colonial”. Trata-se de uma hipótese original para o entendimento do “indigenismo” como fenômeno global que somente faz sentido se considerarmos as lutas seculares e particulares dos povos indígenas como constitutivas de uma comunidade global de resistência. \nPor fim, o artigo “A comemoração do massacre de Kuruyuki entre os Guarani na Bolívia, do doutorando em Ciências Sociais, Wildes Andrade, descreve etnograficamente uma das muitas faces do movimento Guarani em sua recente expressão em termos nacionais, com datas comemorativas, bandeira, hino etc. Para o autor, mais do que um simples empréstimo ou imitação de práticas do Estado nacional boliviano, hoje Estado Plurinacional da Bolívia, os significados e práticas dos Guarani durante a comemoração do massacre de Kuruyuki expressa uma forma de se configurarem como sujeitos políticos autonomistas em relação ao Estado “sem que isso implique necessariamente desejo de construir um Estado guarani, ao menos até o presente etnográfico”. O intenso trabalho de intelectuais públicos indígenas na ressignificação do idioma político eurocêntrico que se vale de conceitos de nação, direitos e cultura, é destacado no artigo para elucidar o papel ativo dos indígenas diante das imposições coloniais, republicanas e mesmo pós-coloniais - como são ventiladas pelos sucessivos governos de Evo Morales. Assim como já visto neste dossiê, o papel transformador da educação na formação de intelectuais interculturais foi decisivo para os Guarani instituírem a comemoração de um massacre ocorrido no fim do século XIX como produção cultural de um movimento com demandas específicas. \nAfirmar que os povos indígenas não são vítimas passivas da história já se tornou, felizmente, senso comum neste início de século. Após mais de quinhentos anos de participação e lutas nos processos históricos que configuraram as sociedades latino-americanas, aprendemos que os povos indígenas são herdeiros de memórias de longa duração das violências e formas de dominação e exploração que caracterizam o governo dos brancos. Eles são mais do que conscientes das decisões que foram obrigados a tomar implicando sua reorganização, redefinição e reinvenção permanentes, que fazem do colon","PeriodicalId":205955,"journal":{"name":"Interethnic@ - Revista de Estudos em Relações Interétnicas","volume":"45 1","pages":"0"},"PeriodicalIF":0.0000,"publicationDate":"2018-08-26","publicationTypes":"Journal Article","fieldsOfStudy":null,"isOpenAccess":false,"openAccessPdf":"","citationCount":"0","resultStr":"{\"title\":\"Apresentação\",\"authors\":\"Cristhian Teófilo da Silva\",\"doi\":\"10.26512/interethnica.v21i2.12247\",\"DOIUrl\":null,\"url\":null,\"abstract\":\"Estudos e pesquisas entre povos indígenas nas Américas tem assinalado a permanência das dinâmicas neocoloniais de exploração de suas populações, territórios e recursos colocando em questão a efetividade dos direitos reconhecidos nacional e internacionalmente nas últimas duas décadas do século XX. 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Parafraseando Marcel Mauss, depreende-se de seu texto de que forma a comunalidad assume contornos de um “fato social comunal”, responsável por um processo intenso de ressacralização do território que ressignifica, dentre outros entes naturais, o vento como força vital para que o mesmo não seja convertido em mercadoria. \\nO artigo seguinte, “Consciência identitária, autonomia, participação e consulta: Caminhos para superação de práticas coloniais”, de Thiago Almeida Garcia, também doutor em Ciências Sociais, parte de pesquisas comparadas sobre situações sociais internacionais de discussão sobre o direito de consulta prévia e entrevistas com lideranças indígenas sul-americanas, sobretudo do Brasil e Bolívia, para apreender estas situações como arenas políticas onde são disputados o sentido e o controle do que vem a ser um “direito de consulta”. Destacam-se duas posições ideológicas. A primeira, originada no contexto institucional burocratizado e tutelar dos Estados nacionais. E, a segunda, originada no direito à autodeterminação conquistado pelos povos indígenas nas décadas de 80 e 90 do século passado. Dos embates entre estas perspectivas, as “relações entre povos indígenas, Estados e sociedades nacionais têm raízes profundas, que acionam memórias coletivas guardadas em depósitos coloniais”. Deste modo, Thiago Almeida Garcia compreende que as lutas e resistências indígenas se fazem necessárias até mesmo nas situações de construção de seus direitos e nas tentativas de viabilizar sua efetivação no âmbito internacional. Segundo Thiago Almeida Garcia: “Mais do que nos arcabouços jurídicos ou nos discursos proferidos em instâncias internacionais, são nas situações em que os direitos indígenas ‘ameaçam’ ou ‘travam’ ações estratégicas estatais que se pode identificar quais são os posicionamentos governamentais e as visões da sociedade sobre os povos indígenas”. 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摘要

对美洲土著人民的研究表明,对其人口、领土和资源的新殖民动态的持久性,使人对20世纪最后二十年国家和国际承认的权利的效力提出了质疑。新世纪开始时不利的政治和经济形势构成了一种实际上倒退和解构土著人民原始权利的框架。因此,反思权力和当代形式的抵抗过程,这些过程旨在在社会文化多样性的湮灭中反复出现,成为伦理和政治的要求,而不是认识论的要求。考虑到批判性、比较、多学科和区域反思的紧迫性,以面对21世纪种族间关系的复杂性,本档案的提出是为了促进数据的可见性和交流和分析,从最近的研究,经验基础和理论创新此外,批判性反思有助于在拉丁美洲种族间政治范围内讨论权力关系以及土著抵抗的形式和做法。该档案收集了四项研究和一项关于墨西哥瓦哈卡、玻利维亚高原和查科以及巴西罗赖马的土著斗争的研究。因此,我们有四个转喻的拉丁美洲宏观区域,分别是中美洲、安第斯山脉、查科和圭亚那或“拉夫拉多”的大草原。最后,它提出了一个理论对话,将世界体系的分析和非殖民视角结合起来,以促进对巴西土著暴力和抵抗的长期方法。这些工作共同阐明了国家土著立法的法律方面以及关于土著人民协商权的国际公约和条约;质疑涉及土著人民、国家和民族社会的种族间关系的历史;强调教育在政治形成和拟订可能的跨文化项目方面的中心地位,以确保土著人民的未来和自治;并通过丰富的人种学数据,复杂的人种学和人种历史问题,证明了当代土著政治思想的复杂性。每一篇文章都单独呈现了在一个不断变化的世界中,土著抵抗的多种和不断重新设计的形式的变化,并有可能退回到他们的国家和新自由主义形式,与种族和文化多样性有关。社会科学博士Clarissa Noronha Melo Tavares在一篇题为“瓦哈卡/墨西哥的共同主义是一种反殖民主义和认知动力”的文章中,从人种学的角度描述了土著斗争和集体抵抗在土著领土上安装大型风力发电项目的企图的背景。对于它的描述,它使用自己的社区组织理想,由共性的想法定义,作为其叙事的主线。因此,作者避免了民族志权威的滥用,优先考虑土著概念,以调整实地数据。套用马塞尔·莫斯(Marcel Mauss)的话,我们可以从他的文本中推断出共性是如何形成一个“社会共性事实”的,这是一个强烈的重新神圣化领土的过程,在其他自然实体中,这意味着风作为一种生命力,因此它不会被转化为商品。下一篇文章,“身份意识、自治、参与和协商:方法克服殖民实践”,蒂亚戈·加西亚博士也在社会科学研究与社会环境的一部分,国际讨论协商的权利,以及南美土著领导的访谈,特别是巴西和玻利维亚,抓住这些政治情况和实验的意义和控制是有争议的“法律咨询”是怎么回事。有两种意识形态立场。第一种,起源于官僚主义的制度背景和民族国家的监护。第二种是土著人民在上世纪八九十年代赢得的自决权。在这些观点之间的冲突中,“土著人民、国家和民族社会之间的关系有着深刻的根源,触发了保存在殖民仓库中的集体记忆”。因此,蒂亚戈·阿尔梅达·加西亚明白,土著人民的斗争和抵抗是必要的,即使是在建立他们的权利和努力使其在国际范围内有效的情况下。
本文章由计算机程序翻译,如有差异,请以英文原文为准。
Apresentação
Estudos e pesquisas entre povos indígenas nas Américas tem assinalado a permanência das dinâmicas neocoloniais de exploração de suas populações, territórios e recursos colocando em questão a efetividade dos direitos reconhecidos nacional e internacionalmente nas últimas duas décadas do século XX. A conjuntura política e econômica adversa no início deste novo século tem configurado um quadro de virtual retrocesso e desconstrução dos direitos originários dos povos indígenas. Por esta razão, refletir sobre o poder e as formas contemporâneas de resistência aos processos que se pretendem reincidentes na aniquilação da diversidade sociocultural faz-se uma exigência ao mesmo tempo ética e política, além de epistêmica, no atual momento. Considerando a urgência de uma reflexão crítica, comparativa, multidisciplinar e regional para fazer frente à complexidade das relações interétnicas no século XXI, este dossiê foi proposto com vistas a fomentar a visibilidade e trocas de dados e análises a partir de pesquisas recentes, empiricamente embasadas e teoricamente inovadoras, além de reflexões críticas que contribuam para o debate das relações de poder e das formas e práticas de resistência indígena no âmbito da política interétnica na América Latina. O dossiê reuniu quatro pesquisas e um estudo abrangendo as lutas indígenas em Oaxaca no México, no altiplano e no chaco bolivianos e em Roraima no Brasil. Desta maneira, temos quatro macrorregiões latino-americanas metonimicamente representadas, respectivamente, a Mesoamérica, os Andes, o Chaco e as savanas das guianas ou “lavrado”. Por fim, apresenta um diálogo teórico que aproxima a análise do Sistema Mundo e a perspectiva decolonial para promover uma abordagem de longa duração à violência e resistência indígena no Brasil. Os trabalhos, em conjunto, iluminam aspectos jurídicos das legislações indigenistas nacionais e das convenções e tratados internacionais sobre o direito de consulta entre os povos indígenas; problematizam a história das relações interétnicas envolvendo povos indígenas, estados e sociedades nacionais; tematizam a centralidade da educação para formação política e para a elaboração de projetos interculturais possíveis para assegurar o futuro e a autonomia dos povos indígenas; e percorrem, com profusão de dados etnográficos, questões etnológicas e etnohistóricas complexas que demonstram a sofisticação do pensamento político indígena contemporâneo. Individualmente, cada artigo apresenta uma variação das múltiplas e sempre reelaboradas formas de resistência indígena em um mundo em permanente transformação e risco de retroagir em suas formas estatais e neoliberais de se relacionar com a diversidade étnica e cultural. No artigo “A comunalidad como dinâmica anticolonialista e epistêmica em Oaxaca/México”, Clarissa Noronha Melo Tavares, doutora em Ciências Sociais, descreve etnograficamente o contexto de luta e resistência coletiva indígena frente às tentativas de instalação de um megaprojeto de energia eólica nos territórios indígenas. Para sua descrição, serve-se do próprio ideal organizativo comunitário, definido pela ideia de comunalidad, como fio condutor de sua narrativa. Desse modo, a autora evita incorrer nos abusos da autoridade etnográfica dando primazia às concepções indígenas para alinhavar os dados de campo. Parafraseando Marcel Mauss, depreende-se de seu texto de que forma a comunalidad assume contornos de um “fato social comunal”, responsável por um processo intenso de ressacralização do território que ressignifica, dentre outros entes naturais, o vento como força vital para que o mesmo não seja convertido em mercadoria. O artigo seguinte, “Consciência identitária, autonomia, participação e consulta: Caminhos para superação de práticas coloniais”, de Thiago Almeida Garcia, também doutor em Ciências Sociais, parte de pesquisas comparadas sobre situações sociais internacionais de discussão sobre o direito de consulta prévia e entrevistas com lideranças indígenas sul-americanas, sobretudo do Brasil e Bolívia, para apreender estas situações como arenas políticas onde são disputados o sentido e o controle do que vem a ser um “direito de consulta”. Destacam-se duas posições ideológicas. A primeira, originada no contexto institucional burocratizado e tutelar dos Estados nacionais. E, a segunda, originada no direito à autodeterminação conquistado pelos povos indígenas nas décadas de 80 e 90 do século passado. Dos embates entre estas perspectivas, as “relações entre povos indígenas, Estados e sociedades nacionais têm raízes profundas, que acionam memórias coletivas guardadas em depósitos coloniais”. Deste modo, Thiago Almeida Garcia compreende que as lutas e resistências indígenas se fazem necessárias até mesmo nas situações de construção de seus direitos e nas tentativas de viabilizar sua efetivação no âmbito internacional. Segundo Thiago Almeida Garcia: “Mais do que nos arcabouços jurídicos ou nos discursos proferidos em instâncias internacionais, são nas situações em que os direitos indígenas ‘ameaçam’ ou ‘travam’ ações estratégicas estatais que se pode identificar quais são os posicionamentos governamentais e as visões da sociedade sobre os povos indígenas”. Ou seja, a cena internacional mostra-se longe de estabelecer a eticidade discursiva imprescindível para o diálogo interétnico, como preconizava Roberto Cardoso de Oliveira. O terceiro artigo, “Terra, luta e (trans)formação no movimento indígena de Roraima”, de João Francisco Kleba Lisboa, doutor em Antropologia Social, compreende a resistência indígena a partir da centralidade dos processos educacionais para a formação política de intelectuais e lideranças indígenas, assim como, de novas gerações de Makuxi e Wapichana, anteriormente submetidos à regimes de dominação e exploração escravagista. O que o autor propõe “é ver a escola indígena como um motor de transformação, mas não nos moldes daquilo que o Ocidente passou a conceber como ‘transformação histórica’, um processo inexorável no tempo (...)”. Segundo ele, é a própria transformação que passa a ser transformada, de um processo de assimilação etnocida para um movimento de construção da autonomia. A etnografia que serve de base para o artigo demonstra eficazmente de que modo os povos indígenas se utilizam de instituições e conceitos da sociedade nacional, como “escola” e “educação”, que em nossas sociedades voltam-se para a formação de indivíduos adaptados a uma economia de mercado, para construir projetos coletivos de formação de lideranças e difundir valores e sentimentos indígenas necessários à recuperação do território e sustentabilidade de seus povos e aldeias. No artigo de Sandra Nascimento, doutora em Ciências Sociais, e Ana Catarina Zema Resende, doutora em História, intitulado: “Lógicas do Sistema Mundo moderno/colonial e violências contra os povos indígenas no Brasil”, as autoras desenvolvem “uma proposta de reflexão teórica para o enquadramento da violência histórica cometida contra os povos indígenas no Brasil a partir do diálogo com a perspectiva de análise do Sistema Mundo moderno/colonial”.   O artigo vem ao encontro, portanto, de preocupações teóricas e metodológicas recentes que reivindicam o estudo das violências praticadas contra os povos indígenas a partir de perspectivas que sejam capazes de articular processos macro-históricos com situações micro-sociológicas, de modo a abarcarmos a acumulação de violências historicamente cometidas como decisiva para a persistente vulnerabilidade em que se encontram os povos indígenas nos dias de hoje. Segundo as autoras, “o fato dos povos indígenas de todo mundo terem vivenciado experiências semelhantes de violações de seus direitos mostra que o que lhes acontece é sobredeterminado pelas dinâmicas do Sistema Mundo moderno/colonial”. Trata-se de uma hipótese original para o entendimento do “indigenismo” como fenômeno global que somente faz sentido se considerarmos as lutas seculares e particulares dos povos indígenas como constitutivas de uma comunidade global de resistência. Por fim, o artigo “A comemoração do massacre de Kuruyuki entre os Guarani na Bolívia, do doutorando em Ciências Sociais, Wildes Andrade, descreve etnograficamente uma das muitas faces do movimento Guarani em sua recente expressão em termos nacionais, com datas comemorativas, bandeira, hino etc. Para o autor, mais do que um simples empréstimo ou imitação de práticas do Estado nacional boliviano, hoje Estado Plurinacional da Bolívia, os significados e práticas dos Guarani durante a comemoração do massacre de Kuruyuki expressa uma forma de se configurarem como sujeitos políticos autonomistas em relação ao Estado “sem que isso implique necessariamente desejo de construir um Estado guarani, ao menos até o presente etnográfico”. O intenso trabalho de intelectuais públicos indígenas na ressignificação do idioma político eurocêntrico que se vale de conceitos de nação, direitos e cultura, é destacado no artigo para elucidar o papel ativo dos indígenas diante das imposições coloniais, republicanas e mesmo pós-coloniais - como são ventiladas pelos sucessivos governos de Evo Morales. Assim como já visto neste dossiê, o papel transformador da educação na formação de intelectuais interculturais foi decisivo para os Guarani instituírem a comemoração de um massacre ocorrido no fim do século XIX como produção cultural de um movimento com demandas específicas. Afirmar que os povos indígenas não são vítimas passivas da história já se tornou, felizmente, senso comum neste início de século. 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